Ao dissolver governo interino de quatro anos, oposição venezuelana não oferece estratégia para enfrentar Maduro, que sai fortalecido. O líder da oposição venezuelana, Juan Guaidó, fala durante uma entrevista à Reuters, em Caracas, Venezuela, em 6 de dezembro de 2022
REUTERS/Gaby Oraa
Aos poucos, caíram os principais pilares que sustentavam Juan Guaidó no exterior como autoproclamado presidente interino da Venezuela. Donald Trump, nos EUA; Ivan Duque, na Colômbia; Mauricio Macri, na Argentina; Sebastián Piñera, no Chile; e, por fim, Jair Bolsonaro, no Brasil. Sua sobrevivência como única alternativa para derrubar Nicolás Maduro também se esvaiu internamente, até ser rechaçado como líder da oposição pela maioria dos partidos que se opõem ao regime venezuelano.
Incensado como a face da resistência à ditadura, Guaidó não conseguiu aglutinar apoio popular nos quatro anos em que esteve à frente da oposição para cumprir seu objetivo. No penúltimo dia de 2022, com 72 votos a favor, 29 contra e oito abstenções, os 104 legisladores da Assembleia Nacional o destituíram como presidente do governo paralelo, ironizado por Maduro como o governo da Nárnia.
A decisão de rifar Guaidó, contudo, não deixa a oposição em situação confortável. Ao contrário, expõe as velhas rixas diante do cenário eleitoral em 2024. “Espero ver em breve os frutos desta ‘mudança de estratégia’ tão custosa politicamente. Mas temo que hoje Maduro ganhou”, atestou Benigno Alarcón Deza, diretor do Centro de Estudos Políticos e Governamentais da Universidade Católica Andrés Bello.
Os partidos Primeiro Justiça, Ação Democrática e Um Novo Tempo, que capitanearam o fim do governo interino, alegaram que o presidente “não é percebido mais como uma opção real de mudança”. Os 60% de aprovação de Guaidó em 2019, como líder do Vontade Popular, foram reduzidos a 20%.
Esta trajetória de altos e baixos se amparou no governo Trump, que apostou em Guaidó para substituir Maduro e 22 anos de supremacia chavista na Venezuela. O líder da Assembleia Nacional – último reduto opositor no país — prometia a rápida convocação de eleições e angariou apoio da maioria dos governos latino-americanos e europeus.
A tentativa fracassada de deflagrar uma rebelião militar, em abril de 2019 mostrou que Maduro arregimentava forças no setor. A euforia das manifestações populares contra o ditador deu vez à apatia.
Ainda assim, Guaidó foi recebido com ovação no Congresso dos EUA como líder da Venezuela, em um dos discursos de Trump sobre o Estado da Nação. O governo americano apertava as sanções contra Maduro e seu círculo íntimo para estrangular o regime. Qualificou o presidente como criminoso e ofereceu recompensa de US$ 15 milhões.
Essa estratégia fracassou. Embora Joe Biden formalmente ainda reconheça Guaidó, sob o seu comando na Casa Branca, o governo americano vem suavizando as relações com Maduro. As prioridades são outras: a guerra de Putin na Ucrânia deflagrou a crise de combustíveis e levou os EUA a liberarem US$ 3 bilhões em ativos venezuelanos bloqueados, a serem destinados a programas sociais. Os dois países negociam o retorno das operações da Chevron na Venezuela.
Paralelamente, países da América Latina retomaram governos alinhados à esquerda, que ajudaram a enfraquecer o prestígio de Guaidó no exterior e a empurrar a sua administração para o terreno da ficção. Foi assim com o colombiano Gustavo Petro, que recuperou as relações com a Venezuela e visitou Maduro em Caracas.
Com o Brasil não será diferente. Durante a campanha, Luiz Inácio Lula da Silva classificou Guaidó como impostor, mas defendeu a alternância de poder na Venezuela, com eleições livres. Após a vitória, Maduro, por sua vez, nomeou o diplomata Manuel Vicente Vadell embaixador no Brasil, reatando as relações diplomáticas interrompidas com o governo brasileiro. A venezuelana Maria Teresa Belandria, representante de Guaidó em Brasília e reconhecida por Jair Bolsonaro como embaixadora, deixou o cargo.
Ao dissolver o governo interino, o chamado G3, grupo formado pelos três principais partidos de oposição na Venezuela, não ofereceu uma nova estratégia para enfrentar Maduro. Em comunicado, informou que a estratégia empreendida por Guaidó “não alcançou os objetivos de libertação” e ressaltou a necessidade de encontrar novos caminhos que levem o país à democracia.
O foco agora está nas primárias deste ano. Com a oposição mais uma vez fraturada, Maduro saboreia mais uma vitória e a certeza de que sempre esteve no comando.
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